Já faz algum tempo que questiono a forma como classificamos o que é hard e o que é soft no mundo corporativo – e até mesmo em nossa vida doméstica. Habilidades técnicas e comportamentais, no meu ponto de vista, ocupam pesos distorcidos em nossa sociedade. Falo isso porque acredito que se desenvolver emocionalmente dá muito mais trabalho do que adquirir conhecimento técnico, mas é o segundo que ainda leva a fama de hard, difícil.
Para mim essas definições estão um pouco distorcidas e seguem conversando com modelos antigos de eficiência, que mensuram resultados desconsiderando o que mais importa: as relações e o desenvolvimento humano. É isso o que nos define como espécie, e é a partir disso que podemos criar reais possibilidades de transformação do mundo em que vivemos.
Não quero medir pesos. Habilidades técnicas e emocionais são sempre complementares. Mas quero atentar para o fato de que sem relações maduras, sem uma boa gestão de pessoas, o crescimento de qualquer empresa se torna frágil. Sem o desenvolvimento individual de capacidades emocionais, que incluem fazer empatia, ter senso ético e crítico, dar alimento constante para a criatividade, identificar emoções e saber expressá-las, ter jogo de cintura na hora em que a coisa aperta, estamos condenados a reproduzir os sistemas falidos que já conhecemos, sejam eles econômicos, administrativos ou sociais.
A questão é que criamos estruturas que enaltecem o conhecimento técnico e, portanto, sabemos onde procurá-lo e como adquiri-lo. Nosso sistema educacional é voltado para isso. Porém, para desenvolver soft skills, é preciso uma busca um pouco mais subjetiva e, de verdade, nada suave como sugere o nome. Porque se conhecer dá um trabalho danado, e mudar o próprio comportamento, cheio de entraves emocionais tão arraigados, às vezes parece ser o trabalho mais árduo da vida.
O fato é que tais habilidades são essenciais não só para o crescimento profissional. Na maternidade, por exemplo, observo o quão hard é cuidar dos filhos, ser assertivo no processo de educação, me tornar uma pessoa melhor para servir de exemplo. Esses são meus reais desafios como mãe, e poderia dizer que é um dos melhores MBA disponíveis no mercado. O fato é que lidar com isso pode ser tão profundo que acabamos terceirizando o serviço. Não sabemos onde procurar ajuda e recursos para nos desenvolvermos como pais e mães, como seres humanos que cuidam de outros seres humanos.
Isso é o hard da vida: encarar de frente nosso mundo interno e ajustá-lo pouco a pouco, com boas doses de paciência, vulnerabilidade, aceitação e carinho. Encarar também os mecanismos do outro e encontrar pontos de intersecção capazes de tirar o melhor da relação.
São esses encontros tão desafiadores, conosco e com quem nos rodeia, que nos fazem de fato crescer, expandir. E são deles, e somente deles, que podem nascer dinâmicas mais construtivas, estruturas menos rígidas e mais assertivas, grandes parcerias, projetos inovadores e sustentáveis, um mundo mais soft para deixarmos como legado.
Flávia de Oliveira Ramos
Amazona de Si
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